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by Remisson Aniceto | |
Published on: Oct 8, 2007 | |
Topic: | |
Type: Poetry | |
https://www.tigweb.org/express/panorama/article.html?ContentID=16393 | |
Sou estranho nesta terra. Estranho? E por que sou? É que longe, aquém das serras, a alma me abandonou... Estrangeiro sou e não ardo. Meu corpo segue em névoa calma. Não carrego nenhum fardo: não sofre quem não tem alma. Piso as pedras do caminho livre, só, sem rumo certo. E por ser assim _ sozinho _ nada é longe, nada é perto... Estou aqui, além, aquém, não importa meu destino; se não me espera ninguém, meu viver é peregrino. Sou estranho nesta terra. Estranho? E por que sou? É que longe, aquém das serras, a alma me abandonou... Ser estranho é ser feliz, é ter tudo e não ter nada, ser mestre e aprendiz, tendo a casa na estrada. Vai, alma, não voltes mais! Vê se te aportas noutro porto. Ser assim muito me apraz: não ser vivo nem ser morto... Se meu corpo não tem alma, minh'alma um corpo não tem. Tal estado hoje me acalma; a ela não sei se convém. Sou estranho nesta terra. Estranho? E por que sou? É que longe, aquém das serras, a alma me abandonou... Sou meio-termo inteiro, animal de consciência; sou ar puro e passageiro, que de si não dá ciência. Minh'alma foi carcereira do corpo, as rédeas tomava. Fingia ser companheira enquanto só regras ditava. Perdi amor e felicidade, que a ela não interessava. Hoje há paz e não saudade da alma que o corpo matava. Sou estranho nesta terra. Estranho? E por que sou? é que longe, aquém das serras, alma me abandonou... Desalmado sou, bem sei, estou solto e desgarrado, livre do mundo, da lei, sem presente e sem passado. Minh'alma já foi bem tarde se perder por outros lados. Faço tudo sem alarde: sem alma não há pecado. Vai, alma, pedir pousada em corpo que te receba. Sou feliz e não me agrada te encontrar pelas veredas. Sou estranho nesta terra. Estranho? E por que sou? É que longe, aquém das serras, a alma me abandonou... É bom que eu seja assim, como nuvem passageira... Que o mundo não saiba de mim. Sou quem não fede nem cheira. Fui louco, tolo, bastardo, a alma de mim fez desdém. Leitores, compreendam meu fado: a alma jamais fez-me bem. Serei o que queiram que eu seja. Se quiserem, serei ninguém. Sou o novo que viceja do que já foi velho. Amém! Sou estranho nesta terra. Estranho? E por que sou? É que longe, aquém das serras, a alma me abandonou... Poema publicado no livro "Nova coletânea de poetas mineiros" - 1985 « return. |