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Sou estranho nesta terra. 
Estranho? E por que sou? 
É que longe, aquém das serras, 
a alma me abandonou... 
 
Estrangeiro sou e não ardo. 
Meu corpo segue em névoa calma. 
Não carrego nenhum fardo: 
não sofre quem não tem alma. 
 
Piso as pedras do caminho 
livre, só, sem rumo certo. 
E por ser assim _ sozinho _ 
nada é longe, nada é perto... 
 
Estou aqui, além, aquém, 
não importa meu destino; 
se não me espera ninguém, 
meu viver é peregrino. 
 
Sou estranho nesta terra. 
Estranho? E por que sou? 
É que longe, aquém das serras, 
a alma me abandonou... 
 
Ser estranho é ser feliz, 
é ter tudo e não ter nada, 
ser mestre e aprendiz, 
tendo a casa na estrada. 
 
Vai, alma, não voltes mais! 
Vê se te aportas noutro porto. 
Ser assim muito me apraz: 
não ser vivo nem ser morto... 
 
Se meu corpo não tem alma, 
minh'alma um corpo não tem. 
Tal estado hoje me acalma; 
a ela não sei se convém. 
 
Sou estranho nesta terra. 
Estranho? E por que sou? 
É que longe, aquém das serras, 
a alma me abandonou... 
 
Sou meio-termo inteiro, 
animal de consciência; 
sou ar puro e passageiro, 
que de si não dá ciência. 
 
Minh'alma foi carcereira 
do corpo, as rédeas tomava. 
Fingia ser companheira 
enquanto só regras ditava. 
 
Perdi amor e felicidade, 
que a ela não interessava. 
Hoje há paz e não saudade 
da alma que o corpo matava. 
 
Sou estranho nesta terra. 
Estranho? E por que sou? 
é que longe, aquém das serras, 
alma me abandonou... 
 
Desalmado sou, bem sei, 
estou solto e desgarrado, 
livre do mundo, da lei, 
sem presente e sem passado. 
 
Minh'alma já foi bem tarde 
se perder por outros lados. 
Faço tudo sem alarde: 
sem alma não há pecado. 
 
Vai, alma, pedir pousada 
em corpo que te receba. 
Sou feliz e não me agrada 
te encontrar pelas veredas. 
 
Sou estranho nesta terra. 
Estranho? E por que sou? 
É que longe, aquém das serras, 
a alma me abandonou... 
 
É bom que eu seja assim, 
como nuvem passageira... 
Que o mundo não saiba de mim. 
Sou quem não fede nem cheira. 
 
Fui louco, tolo, bastardo, 
a alma de mim fez desdém. 
Leitores, compreendam meu fado: 
a alma jamais fez-me bem. 
 
Serei o que queiram que eu seja. 
Se quiserem, serei ninguém. 
Sou o novo que viceja 
do que já foi velho. Amém! 
 
Sou estranho nesta terra. 
Estranho? E por que sou? 
É que longe, aquém das serras, 
a alma me abandonou... 
 
Poema publicado no livro "Nova coletânea de poetas mineiros" - 1985  
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 Writer Profile 
Remisson Aniceto
  
 
Nasci em Nova Era, pequena e aconchegante cidade do interior de Minas Gerais. Tão logo aprendi as primeiras palavras comecei a agrupá-las e percebi, encantado, que o efeito era muito bom. Escrevo, ainda que razoavelmente, desde os oito anos e minha preferência é pela poesia, mas me arrisco a emitir opiniões sobre diversos temas. Um dos assuntos que mais me interessam e para o qual recebo muitos pedidos é presevação ambiental. As críticas aos meus trabalhos, favoráveis ou não, serão sempre bem-vindas
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